terça-feira, 29 de setembro de 2009

Uma CPI para frear a luta popular

Para senador, Comissão Parlamentar de Inquérito contra o MST é ideológica

Para senador, Comissão Parlamentar de Inquérito contra o MST é ideológica

“O problema fundiário brasileiro não é um problema de contas, do MST ou das entidades ruralistas. Até porque estes receberam nos últimos dez anos R$ 1 bilhão, enquanto as entidades ligadas aos trabalhadores receberam 41 milhões. Não se trata disso. Se trata da raiz do problema: de entender o problema da concentração de terras, da grilagem”. Isso foi proferido em dezembro de 2005 pelo ex-relator da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Terra (2003-2005) e atual vereador de Fortaleza (CE), João Alfredo Telles (Psol).

Agora, diante de uma outra tentativa de instauração de CPI contra o MST, as coisas não mudaram muito. “Há uma intenção muito clara de criminalizar esse movimento; não conseguiram na outra vez”, afirma João Alfredo, se referindo à CPMI da Terra. Para ele, a bancada ruralista tenta, mais uma vez, destruir a referência de luta social que o movimento tem no Brasil e no mundo e a própria necessidade da reforma agrária.

Planejada pela bancada ruralista, e fruto de lobby e monopólios de comunicação, com participação direta da revista Veja, a criação da CPMI contra o MST obteve o apoio de 226 parlamentares. Trata-se da terceira CPMI instalada no Congresso Nacional contra o movimento nos últimos cinco anos. No entanto, para que a comissão seja instalada, é preciso ainda que o presidente do Congresso, senador José Sarney (PMDB-AP), leia o requerimento em plenário para que os partidos indiquem seus representantes.

Desmobilizar

A tentativa da direita ruralista de criminalizar a luta social tem efeitos muitos práticos, não fica somente no simbolismo. “O próprio governo fica acuado e as entidades passam a gastar mais tempo com a defesa jurídica”, explica João Alfredo. Segundo ele, “perde-se o tempo que poderia estar sendo utilizado com o objetivo principal dos trabalhadores, que é a luta pela justiça social no campo”. Desmobilizar a luta social por meio de um procedimento investigativo no Congresso Nacional é um dos objetivos principais dos ruralistas.

De acordo com o senador José Nery (Psol/PA), “os setores conservadores não querem que haja o protagonismo popular”. “Eles querem criar dificuldades para os movimentos sociais que desenvolvem um novo modelo para o país; há uma perseguição e uma tentativa de impedir a participação popular”, explica o senador.

Nery vê semelhanças com a tentativa da direita investigar a Petrobras porque “é uma forma da direita questionar o governo em relação aos custos corretos que ajudem o desenvolvimento local e participação popular, com ONGs que permitem a inclusão social”. Ele conclui que o governo precisa fortalecer “os movimentos que pode alcançar”. Segundo o senador, a direita prefere que “instituições carcomidas pela corrupção” sejam gestoras do dinheiro público.

Índice

Segundo o próprio MST, a tentativa da direita ruralista de instaurar uma CPI é uma resposta ao possível cumprimento por parte do governo federal da Constituição Federal de 1988 e da Lei Agrária, de fevereiro de 1993, segundo a qual "os parâmetros, índices e indicadores que informam o conceito de produtividade serão ajustados, periodicamente, de modo a levar em conta o progresso científico e tecnológico da agricultura e o desenvolvimento regional".

O “índice de produtividade” é, de acordo com João Alfredo, o argumento prático utilizado pelos latifundiários “para tentar acuar Lula e fortalecer o ministro da Agricultura, Reinold Stephanes”.

Pau-oco

A senadora Kátia Abreu (DEM/TO) vem destacando na imprensa corporativa que uma das primeiras investigações da CPI será em cima do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) de São Paulo. Para Plínio Arruda Sampaio, presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra), isso não ocorre à toa, pois, segundo ele, é o Incra do Estado de São Paulo que mais tem assumido a reforma agrária no país. “É a única superintendência que está tentando de fato”, conclui.

Sobre a senadora, João Alfredo é categórico: “Qual é a autoridade moral que ela tem? Ela instrumentalizou a CNA”. De fato, existem fortes indícios de que a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil tenha servido como “caixa-dois” na campanha de Kátia Abreu ao Senado, em 2006.

“Para cima”

Com a experiência que teve na CPMI da Terra, João Alfredo acredita que uma possível CPMI contra o MST pode se transformar em duas CPIs, uma dos ruralistas e outra da reforma agrária. Monta-se um ringue político-ideológico. “Se sair a CPI, os lutadores da reforma agrária têm que ir para cima”, conclui João Alfredo. O senador João Nery afirma que existe a possibilidade dessa mesma CPMI investigar as ONGs ligadas à CNA e conta que já consultou outros parlamentares sobre o tema.

Brasil de fato

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